Canção para Ninar Menino Grande, 136 páginas, é da Pallas
O livro conta a história de um homem chamado Fio Jasmim, grande mulherengo, e suas aventuras sexuais pelo interior do Brasil, enquanto viaja pelas ferrovias trabalhando como maquinista.
O registro é um tanto fantasioso, se aproximando por vezes de um conto de fadas ou uma narrativa mitológica. Abundam mulheres que são verdadeiras maravilhas da sedução, beldades mitológicas, pelas quais todos os homens da cidade se arrastam.
“As águas do rio Naipã aumentaram de volume, tanto foi em abundância o líquido sêmen escorrido do corpo dele, já que nem tudo cabia no corpo dela”.
As cidades, por exemplo, têm nomes como Dias Felizes, Águas Infindas, Chegada Feliz, Fé Rompida, Ardência Antiga. Os nomes das mulheres também são evocativos: Devaneia, Dolores, Ruiva, Pérola, Véritas, Amorato, Perpétua, Juventina.
A linguagem parece imitar a de um livro infantil. “Conta-se que o homem teria vindo de terras estrangeiras com alguma economia e se metera pelo interior adentro do país, em busca de rios que lhe dessem ouro. Não deu sorte com o ouro, mas encontrou terras de onde nasciam pedras preciosas. Assim (…) construiu uma fortuna, se tornado o homem mais rico da cidade”.
Já o realismo passa longe. Dalva Ruiva, por exemplo, se separa do marido e vai morar numa cidadezinha chamada Dias Felizes. Lá, ela se prostitui para ganhar dinheiro e poder cursar farmácia. Matricula-se “em uma das melhores instituições de ensino superior da cidade de Dias Felizes”. Interessante que uma cidadezinha no meio do nada tenha tantas instituições de ensino superior que se possa falar em “uma das melhores”.
O estilo é bem particular.
Ela não queria que as meninas padecessem de uma orfandade paterna, como ela padecera. Uma orfandade desde o vazio de uma imagem que não se podia construir, pois a anterioridade era construída de um rosto não desenhado, falho, pois sofria de uma não concretude
Nem sempre é sábio duvidar do que parece ser. Venho aprendendo que é bom, às vezes, crer no que parece ser. Pois o parecer ser, quando ninguém ainda percebe, é o ser
Os capítulos são repetitivos. Em certa cidadezinha, há uma mulher que não sai muito de casa e não tem nenhum homem em sua vida. Principalmente sem pai, nenhuma delas tem pai. Um belo dia Fio Jasmim chega por ali, e ela o recebe. Apaixona-se; transam; ela engravida. Ela nunca pede ou espera nada dele, nenhuma delas está interessada num relacionamento duradouro.
Ele também, por óbvio, não se importa nem um pouco com delas nem com os filhos que espalha pelo mundo. Isso não impede que a autora o descreva como “trabalhador, bom marido, cumpridor dos deveres de pai [com a ressalva de que ele nem prestava atenção ao crescimento dos filhos], sem vício algum, a não ser gostar muito de mulher”.
Não há drama, não há comédia, não há amor, não há construção de personagens, não há enredo. Há estilo, mas a serviço de quê?
Se é que há um tema subjacente aos capítulos, parece ser este: mulheres sem figura paterna ficam suscetíveis a serem seduzidas por malandros.
Esse livro jamais seria celebrado e levado a sério se não tivesse sido escrito por uma mulher negra consagrada. Tivesse um autor branco e homem, e um protagonista branco, e seria atacado por retratar mulheres como frágeis e disseminar masculinidade tóxica. Aliás, nem seria publicado. O que talvez fosse melhor, mesmo.
Três machadadas.
(lembrando que livro sem machadada é ótimo, uma machadada é bom, duas é fraco e três é muito ruim)
“As águas do rio Naipã aumentaram de volume, tanto foi em abundância o líquido sêmen escorrido do corpo dele, já que nem tudo cabia no corpo dela." - que troço grotesco, pelo amor de Deus.
Eu odiei esse livro. Ele só queria ser príncipe aaaaarghhhhhh Raso como uma lâmina d'água